Segurança e cidade desorganizada

     Artigo publicado originalmente pelo Diário do Poder, escrito pelo juiz federal e ex-presidente da Ajufe, Roberto Veloso.

     

    Entre os estudos que fazemos no Curso de Mestrado em Direito da UFMA, debatemos o problema relacionado à degradação de áreas urbanas como fator de aumento da criminalidade. O agora mestre Maurício Fraga, meu orientando, escreveu uma dissertação abordando tema tão caro para a população dos municípios, demonstrando que não cuidar da cidade é fator propulsor da insegurança.

    Não à toa, cada vez mais, quem tem condições financeiras procura morar em condomínios fechados, de preferência onde existam todos os serviços para não se ter necessidade de sair às ruas. Há um pavor coletivo ante a mínima possibilidade de a segurança ser violada por delinquentes que vivem à solta na sociedade.

    Mas, a situação é bem diferente para quem vive de parcos salários ou mesmo não está empregado. Não há alternativa a não ser a periferia ou áreas degradadas no entorno dos condomínios de luxo, estando à mercê da criminalidade e do tráfico de drogas, onde não há serviços ou políticas públicas voltadas para o bem estar da população.

    É lógico que o desemprego, a falta de perspectivas para inserção no mercado de trabalho, a ausência de possibilidade de uma educação adequada para um posterior aproveitamento no comércio ou na indústria produzem um quadro social propício ao recrutamento de jovens pelas organizações criminosas, com a ilusão da melhoria da qualidade de vida e de prosperidade, que evidentemente nunca chegam.

    Segundo Maurício Fraga, os moradores dessas áreas degradadas, além de estarem socialmente excluídos, estão expostos a uma exclusão espacial, pois são indesejados e incompatíveis com a realidade dos bairros nobres, obrigando-os a ocupar espaços onde não há escolas em número suficiente, atendimento médico compatível com a necessidade da população e oportunidade de emprego. Nessas localidades abandonadas, o agente público mais conhecido é o policial, em razão da inexistência de políticas públicas satisfatórias.

    Essa realidade, no entanto, é possível de ser modificada, com a adoção de medidas simples a exemplo das tomadas em outras cidades da América do Sul, como é o caso de Medellin, que em 1991 possuía um índice de 381 homicídios para cada grupo de 100 mil habitantes e conseguiu reduzir, em 2006, para 28.

    Primeiro, se fez uso sistemático de avaliações precisas das condições de vida na cidade, por meio de dois instrumentos: índice de desenvolvimento humano (IDH) e pesquisa de qualidade de vida. Depois, adotou-se a transparência dos gastos públicos como base da administração municipal, para possibilitar à população o acompanhamento da execução orçamentária.

    A integração de todos os programas e projetos de maneira que toda ação fosse desenvolvida de forma a não haver discrepância entre os agentes públicos, em especial o urbanismo com a recuperação das áreas degradadas e a educação para que todos tenham consciência da necessidade de desmantelar a violência e construir espaços urbanos de convivência pacífica e ordeira.

    Por fim, a participação popular para que as intervenções a serem realizadas tenham a legitimidade e o apoio das comunidades. A presença do poder público deve ser tomada como necessária e pacífica e não como inimiga. A população precisa ser envolvida de forma a influir decisivamente na formulação e na execução do projeto.

    O município é o lugar apropriado para a realização de medidas, fora do âmbito da mera punição penal, para a modificação da realidade de insegurança e criminalidade a que estamos submetidos. E se todos estão atingidos, todos devem ser chamados ao enfrentamento e solução do problema.

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