A 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) determinou na última semana, por unanimidade, o recebimento, pela 3ª Vara Federal de Santa Maria/RS, de uma ação popular que solicita a apreensão e a não utilização de apostilas de um curso pré-universitário popular vinculado à Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Assim, fica anulada a sentença que indeferiu o recebimento da ação. Agora, o processo deverá prosseguir com a citação dos réus e a instrução probatória. A apelação foi julgada pela 4ª Turma em sessão telepresencial realizada no dia 9/6.
A ação popular foi ajuizada em 13 de maio de 2019 por Marcelo Vieira de Almeida, morador de Santa Maria, contra a UFSM e o pró-reitor de Extensão da universidade, Flavi Ferreira Lisboa Filho. O projeto “Pré-Universitário Popular Alternativa” tem o objetivo de oferecer gratuitamente a pessoas de baixa renda estudos preparatórios para o ingresso no ensino superior. As atividades são desenvolvidas por alunos da graduação e da pós-graduação como exercício da prática docente.
Na ação, o autor pediu, em sede liminar, a busca e a apreensão das cartilhas elaboradas pelo curso por supostamente apresentarem conteúdos impróprios à finalidade para a qual se destinam e ofensivos à moralidade administrativa, com “doutrinação ideológica” e elementos de conotação sexual. No mérito, postulou a condenação dos responsáveis ao ressarcimento dos danos causados ao patrimônio público.
Diante da notícia de que a UFSM havia recolhido a cartilha, a 3ª Vara Federal de Santa Maria solicitou parecer do Ministério Público Federal (MPF), que opinou, em junho de 2019, pela extinção do processo sem resolução do mérito, com base formal na falta de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo. A manifestação do MPF foi acolhida pelo juízo em sentença publicada em setembro do mesmo ano.
Autonomia universitária e controle público
Houve recurso de apelação por parte do autor da ação. O relator do processo na 4ª Turma, desembargador federal Cândido Alfredo Silva Leal Junior, destacou, em seu voto, a necessidade de que haja o debate, a apresentação de provas e a resolução no curso da ação popular sobre a permissão ou a proibição das cartilhas, assim como a comprovação do emprego de recursos públicos para a impressão do material didático e a definição da necessidade ou não do ressarcimento dos valores aos cofres públicos.
“A universidade e seus professores gozam de autonomia didática e liberdade pedagógica”, ressaltou o relator. “A Constituição assegura isso às universidades, pois é importante existirem espaços sociais e democráticos que permitam essa liberdade de ensinar, pesquisar, pensar. São espaços muito relevantes para construção de uma sociedade livre, justa, republicana, democrática”. Observou, porém, que, “como tudo numa democracia”, essa garantia constitucional de autonomia universitária “não afasta a possibilidade de controle e avaliação por parte do Estado e da sociedade, considerando a natureza pública dos serviços prestados”.
Em seu voto, acompanhado pelos demais componentes da turma, o desembargador ponderou que somente a instrução probatória poderá analisar se os conteúdos dos livretos eram inapropriados. Ainda, aduz que o procedimento interno instaurado pela UFSM para apurar a regularidade do material não substitui o controle popular sobre o ato administrativo, mas sim justifica o debate proposto pelo processo judicial.
Fonte: Assessoria de Comunicação Social do TRF4.