Para Primeira Turma, posse dos documentos atenta contra o princípio da dignidade da pessoa humana e gera danos morais coletivos
A Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) condenou três comerciantes de Dourados/MS ao pagamento de R$ 50 mil, cada um, por danos morais coletivos a uma comunidade indígena do município. Os proprietários de supermercados retiveram indevidamente cartões de benefícios dos membros do grupo, para efetuar a cobrança de compras e serviços oferecidos nos estabelecimentos.
Segundo os magistrados, a posse e retenção de documentos de terceiros retira a liberdade financeira e atenta contra o princípio da dignidade da pessoa humana.
Inicialmente, o Ministério Público Federal (MPF) entrou com ação civil pública requerendo danos materiais e morais coletivos em favor de comunidade indígena sob alegação de que os comerciantes foram responsáveis pela retenção indevida de cartões de benefícios e senhas do grupo a fim de garantir o pagamento de compras e serviços efetuados em seus estabelecimentos.
Após a 1ª Vara Federal de Dourados/MS ter julgado o pedido improcedente, o MPF recorreu ao TRF3.
Ao analisar o caso, o desembargador federal relator Valdeci dos Santos ressaltou que, conforme o processo, os proprietários mantinham cerca de 94 cartões de benefícios, além de papéis com número das senhas, comprovantes de saques, documentos de identidade, notas promissórias em branco e fichas cadastrais.
“A retenção dos cartões dos indígenas se tornou tão corriqueira entre comerciantes da região, que a prática foi objeto de Comissão Parlamentar de Inquérito, denominada CPI da Desnutrição Indígena, na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul. Conclui-se que não se trata de ato isolado, mas de prática contumaz”, destacou.
Na decisão, o magistrado seguiu a doutrina e o entendimento de tribunais superiores, no sentido de que o dano moral coletivo surge de uma conduta injusta em determinada comunidade.
“A posse e retenção de quase uma centena de cartões magnéticos e senhas, sem que os titulares tivessem acesso imediato, necessitando de permissão dos réus para que lhes fossem devolvidos, configura ato que extrai a liberdade financeira da comunidade indígena e atenta contra o princípio da dignidade da pessoa humana”, pontuou.
Por fim, o relator ponderou que o efeito danoso foi agravado por estar inserido em contexto social de miséria e vulnerabilidade de grupos étnicos.
“Soma-se a isso, o fato de a conduta adotada violar, inclusive, o princípio da livre concorrência, uma vez que obriga o indígena a comprar em um determinado lugar e a aceitar as condições que lhe são impostas”, concluiu.
Assim, a Primeira Turma atendeu parcialmente ao pedido do MPF e determinou aos comerciantes a reparação de danos morais coletivos à comunidade em R$ 50 mil para cada um, totalizando o montante de R$ 150 mil.
Fonte: Assessoria de Comunicação Social do TRF3.