Ao final do processo, encargo continuaria com aquele que sair derrotado, a menos que prove não ter condições
Matéria publicada originalmente pelo O Globo.
O Senado deve votar nesta terça-feira (29/3) projeto que determina que as perícias feitas em processos envolvendo benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) devem ser custeadas pela parte derrotada na ação judicial. Antes do término do processo, entretanto, a antecipação do pagamento deverá ficar sob responsabilidade do Executivo, segundo a proposta. A matéria ainda pode passar por alterações.
"O ônus pelos encargos relativos ao pagamento dos honorários periciais referentes às perícias médicas judiciais realizadas em ações em que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) figure como parte e se discuta a concessão de benefícios assistenciais à pessoa com deficiência ou benefícios previdenciários decorrentes de incapacidade laboral ficará a cargo do vencido", determina o projeto.
"O ônus da antecipação de pagamento da perícia, na forma do § 5º deste artigo, recairá sobre o Poder Executivo federal", diz outro trecho da proposta que veio da Câmara.
O relator da proposta no Senado, Nelsinho Trad (PSD-MS), ainda não sabe se vai acatar todas as mudanças feitas pelos deputados. No Senado, a proposta era diferente e obrigava o governo federal a pagar até o fim de 2024 pelas perícias médicas em processos judiciais sobre esses benefícios.
— Toda sugestão para aperfeiçoar o texto sempre é bem-vinda. O mais importante e premente, sem dúvida nenhuma, é resolver esse gargalo para que as perícias judiciais voltem a ser feitas — declarou Trad, ao GLOBO.
Na visão de especialistas, determinar a prerrogativa do pagamento antecipado dos honorários para a União, sem que seja preciso esperar o término do processo, vai contribuir para resolver o impasse.
O projeto vale para benefícios assistenciais a pessoas com deficiência ou por incapacidade laboral, como auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
O texto segue as regras atuais do Código de Processo Civil, que prevê que, para os beneficiários da justiça gratuita, a cobrança fica suspensa se não houver comprovação de que a pessoa tem condições de fazer o pagamento.
Desde setembro de 2021 havia terminado o prazo de vigência de uma outra lei, que atribuía provisoriamente ao Executivo Federal o custeio das perícias. Agora, parlamentares retiraram trecho que mantinha o pagamento com com o Poder Executivo.
Também fica estabelecido que "o pagamento dos honorários periciais limita-se a 1 (uma) perícia médica por processo judicial, e, excepcionalmente, caso determinado por instâncias superiores do Poder Judiciário, outra perícia poderá ser realizada".
Para o presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil, Eduardo Brandão, as alterações propostas pelos deputados demonstram o compromisso por uma solução definitiva ao problema.
— O Congresso teve a sensibilidade de perceber a importância de darmos uma solução perene para o problema que vem se arrastando nos últimos anos e atender da melhor forma o trabalhador. Além disso, corrigiram um grave problema que era a limitação de uma única perícia por processo — disse Brandão.
O impasse sobre orçamento para as perícias com a vigência do teto de gastos públicos, em 2017. Sem previsão orçamentária para o custeio do serviço, o Poder Judiciário, que até então era o responsável financeiro, não conseguiu cumprir as obrigações, o que levou ao não pagamento de peritos durante todo o ano de 2019.
A presidente da Associação Brasileira de Medicina Legal e Perícias Médicas (ABMLPM), Ana Carolina Tormes, explica que o impasse sobre quem custeará o serviço pode desestimular peritos a prestarem o serviço, especialmente em cidades interioranas.
— Fizemos um esforço em 2019 para manter o atendimento à população apesar da falta de pagamento. No entanto, a constante incerteza quanto ao pagamento pode acarretar em evasão de peritos, especialmente para atendimento em cidades do interior, em que o custeio do translado é do próprio profissional — disse.
Conforme mostrou o GLOBO, a espera por uma resposta do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) sobre pedidos de concessão de benefícios faz com que milhões vivam no limbo enquanto a instituição demora a resolver o gargalo da fase de perícias médicas.
O INSS tem hoje o maior número de pessoas à espera de uma resposta da sua história. Há, no mínimo, 2,85 milhões de requerimentos em análise, segundo dados inéditos obtidos pelo GLOBO. Trata-se de um contingente comparável à população de Salvador, quarta cidade mais populosa do país.
Deste total, 964,5 mil são pedidos de benefícios por incapacidade, que dependem de perícia médica.
O volume represado é ainda maior porque não estão computados nesses números outras filas, como a do Conselho de Recursos da Previdência Social, de revisão e manutenção de benefícios e de certificado de tempo de serviço.
Os dados foram levantados a partir de relatórios de auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU), do Tribunal de Contas da União (TCU), do Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS) e do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP).