Conhecendo as Juízas Federais #6 - Cláudia Maria Dadico

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    Dando sequência ao projeto “Conhecendo as Juízas Federais”, a Ajufe apresenta, nesta sexta edição, a juíza federal Cláudia Maria Dadico. Cláudia é juíza federal desde 1996, quando tomou posse no cargo de juíza federal substituta na capital gaúcha, logo após 10 anos sendo servidora do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Em 22 anos de jurisdição, Cláudia teve a oportunidade de julgar inúmeros casos ao longo da carreira. Nos dizeres da magistrada, “todos relevantes”.

    De todo modo, ainda no início da carreira, a juíza se deparou com um caso peculiar para a época: em 1998, ela deferiu a realização de uma cirurgia de transgenitalização para uma cidadã transexual. “Entendi que ali estava ocorrendo uma clara situação de discriminação por identidade de gênero e deferi o pedido”, contou. E continuou: “Estudei muito, pois, à época, não havia muitos precedentes jurisdicionais sobre a questão”.

    Embora tenha tido uma formação escolar e acadêmica sem grandes dificuldades, a magistrada começou a trabalhar bem cedo, aos 17 anos, por vontade de ser independente. Aos 19, começou a trabalhar no TRF3, por vontade de ser independente. Em seguida, continuou os estudos e concluiu sua formação em Direito. Foi quase no final do ano 2000 que Cláudia viveu o momento mais difícil de sua história pessoal. “A maior dificuldade de minha vida, sem dúvida nenhuma foi a perda de minha segunda filha, a Beatriz, em dezembro de 2000, vitimada por meningite, quando tinha 1 aninho e seis meses de idade. Foi devastador. Fiquei fora de circuito durante uns bons anos”, desabafou.

    Um pouco antes, entre 1998 e 1999, a juíza teve as primeiras oportunidades de promoção para a titularidade do cargo. No entanto, a vida pessoal, em especial a relação com o ex-marido, a impediram de dar este passo na carreira. “[Ele] disse que se eu optasse pela promoção, ele pediria o divórcio e a guarda das filhas. Assim, deixei de me inscrever e perdi aproximadamente 40 posições na lista de antiguidade na carreira, decisão da qual me arrependo muito, hoje em dia”, explicou Cláudia.

    A titularidade veio anos depois, após o ano de 2003, quando se divorciou e pediu promoção para a cidade de Rio Grande. A demora na promoção a magistrada atribui, dentre outros motivos, à questão de gênero. “Não tinha ainda consciência de que esses tropeços na vida profissional tinham, entre suas múltiplas causas, também razões de gênero. Se eu fosse homem, talvez essas questões fossem encaminhadas de forma diferente”, conjecturou.

    Quando chegou à Vara Criminal de Florianópolis, enfrentou dificuldades muito grandes. “Uma resistência muito grande à minha liderança e à liderança do Diretor de Secretaria que me acompanhava desde Joinville. Se eu fosse homem, a situação teria um encaminhamento muito diverso”, contou.

    Embora a Magistratura Federal já tenha tido consideráveis avanços no ingresso das mulheres na carreira, ainda há muitos obstáculos para a entrada feminina no Judiciário. Segundo a magistrada são exemplos de barreiras a dupla ou tripla jornada de trabalho. E complementa: “o nível de complexidade das provas exige um grande tempo de preparação com exclusividade, o que retira, ou dificulta muito, o ingresso de candidatas que trabalham”.

    Cláudia conclui a conversa deixando uma mensagem para quem sonha em se tornar juíza federal: “minha mensagem é de força e perseverança, sempre! A magistratura é uma carreira maravilhosa, de muito prestígio e muito valorizada. O Brasil precisa de mais diversidade em sua composição”.

    Leia a entrevista completa.

     

    1) Onde a senhora começou e exerceu a sua jurisdição?

    Comecei a exercer minha jurisdição na cidade de Porto Alegre, na 2ª Vara de Execuções Fiscais, no ano de 1996, após trabalhar por 10 anos como servidora do Tribunal Regional Federal da 3ª Região.

     

    2) Quais foram as suas atuações mais relevantes?

    Durante estes 22 anos de jurisdição, julguei muitos casos, todos relevantes. Entretanto, alguns marcam a memória de maneira peculiar.

    Quando atuava, como juíza substituta ainda, na 12ª Vara Federal de Porto Alegre, deferi, em 1998, a realização de cirurgia de transgenitalização para uma cidadã  transexual. Essa pessoa estava engajada em programa de atendimento no Hospital de Clínicas de Porto Alegre, por uma ampla equipe multidisciplinar, há mais de 3 anos e, no momento decisivo, a cirurgia foi indeferida ao argumento de se tratar de cirurgia de “caráter experimental”. Ocorre que a cirurgia já constava dos protocolos médicos há mais de 20 anos, mas era deferida apenas para casos de acidentes e não para casos como o do processo. Entendi que ali estava ocorrendo uma clara situação de discriminação por identidade de gênero e deferi o pedido. Estudei muito, pois, à época, não havia muitos precedentes jurisdicionais sobre a questão.

    Ainda na 12ª Vara Federal, julguei um caso em que a família de um servidor público que foi cassado, por motivos políticos, durante a ditadura militar, postulava indenização por danos morais. Foi um processo bastante complexo, as audiências reviveram momentos de muita dor daquela família, dos quais ainda hoje me lembro com nitidez.

    No Juizado Especial Federal de Rio Grande, onde também atuei de 2003 a 2010,  recordo-me de momentos muito intensos na sala de audiência. Costumo dizer que as audiências em juizados especiais são laboratórios de empatia. É certo que há uma multiplicidade de situações, mas há casos de muita penúria, muita miséria e muita pobreza, que nos tocam de forma muito intensa, em que pese o nosso dever de aplicar a lei para todos.

    Na cidade de Joinville, onde atuei perante a 2ª Vara Federal, julguei muitos casos relevantes, mas atuei como Diretora do Foro da Subseção, momento em que conseguimos finalizar uma situação envolvendo um terreno para a construção da futura sede da Subseção, o que nos custou muito trabalho, muitas conversas e muitas articulações. Foi uma experiência muito enriquecedora.

    Já em Florianópolis, a partir de 2013, na titularidade da 7ª Vara Federal, de competência criminal exclusiva, especializada em Lavagem de Ativos, Crimes Financeiros e Cooperação Jurídica Internacional, pude expandir meus horizontes para uma área de atuação da jurisdição federal até então inexplorada para mim. Também me dediquei, estudei muito, decidi por retomar meus estudos acadêmicos (estou cursando Doutorado em Ciências Criminais na PUCRS) a fim de prestar a jurisdição mais qualificada e responsável possível, em uma área tão sensível e hoje em dia tão em evidência.

    Atualmente, na Direção do Foro da Seção Judiciária de Santa Catarina, talvez esteja em face do maior desafio profissional de minha carreira. Atuar como gestora pública, ordenadora de despesas, num cenário de restrições orçamentárias e diminuição de quadro de pessoal, tem exigido muito estudo, muita dedicação e muitos esforços pessoais para buscar racionalização, inovação e respostas de qualidade para nosso jurisdicionado.

     

    3) Quais as dificuldades que a senhora já enfrentou?

    Não tive dificuldades em minha formação escolar e acadêmica. Sou filha de classe média e tive o privilégio de ter uma formação preponderantemente em colégios ou escolas particulares de bom nível.

    Comecei a trabalhar bem cedo, aos 17 anos, não por necessidade, mas por vontade de independência mesmo. Meu pai era um homem de valor, conservador, mas muito autoritário na minha adolescência e logo aos 18 anos de idade saí da casa de meus pais para morar sozinha em São Paulo, logo que fui aprovada no concurso para Auxiliar Judiciária (esse era o nome do cargo à época) na Justiça Federal. Lá tive a honra e o privilégio de trabalhar com o hoje Desembargador aposentado Márcio Moraes. Juiz humanista que me guiou nos primeiros passos de minha formação jurídica e me convenceu a fazer a graduação em Direito.

    Cursei Direito no período noturno, no Largo São Francisco, sempre trabalhando.

    Mas, a maior dificuldade de minha vida, sem dúvida nenhuma foi a perda de minha segunda filha, a Beatriz, em dezembro de 2000, vitimada por meningite, quando tinha 1 aninho e seis meses de idade. Foi devastador. Fiquei fora de circuito durante uns bons anos. É uma tragédia pessoal da qual levei muito tempo para me recuperar.

     

    4) A senhora já sofreu alguma dificuldade ou agravamento especial na profissão por ser mulher?

    O concurso no qual fui aprovada (6º concurso do Tribunal Regional Federal da 4ª Região) se iniciou em final de 1995 e terminou em junho de 1996. Na época, eu estava grávida de minha primeira filha, a Marina. Na prova oral eu estava com 08 meses de gravidez. As pessoas, na época, me diziam que eu não seria aprovada, pois os concursos de magistratura não admitiam mulheres grávidas. Muitas pessoas me diziam isso e eu já estava começando a ficar resignada com minha reprovação. Mas, de qualquer forma, continuei estudando e me preparando. Não queria desistir, pois tinha a consciência de que, se não conseguisse êxito naquele momento, depois, com um bebê para cuidar seria mais difícil manter o nível de preparação que um concurso de magistratura federal exige.

    Prossegui com minha preparação e fiquei muito feliz com minha aprovação em uma boa colocação. Tomei posse com quase 9 meses de gravidez. Trabalhei durante uma semana e entrei em licença maternidade. O juiz titular da Vara na qual fui lotada, fez uma brincadeirinha da qual nunca me esqueci: “Todos os juízes de Porto Alegre ganharam juízes substitutos, só a minha veio com defeito”. Achei graça, na época não senti isso como machismo...

    Durante a licença maternidade fui sondada para que julgasse processos de um mutirão, selecionados para atuação dos juízes recém aprovados. Fiquei constrangida, pois senti que não conseguiria julgar processos, com qualidade e celeridade, durante o período de amamentação. Disse que não poderia trabalhar nos processos durante a licença, mas confesso que me senti em desvantagem em relação ao grupo de juízes do meu concurso, pois tive que julgá-los todos no meu retorno, me sentia “atrasada”, como se a licença maternidade tivesse sido um “estorvo”.

    Nos anos de 1998-1999, surgiram as primeiras oportunidades de promoção para o cargo de Juiz Titular para minha turma de concurso. Ocorre que as vagas que me foram disponibilizadas se localizavam em Uruguaiana e em Foz do Iguaçu, numa Vara Criminal. À época, lotada em Porto Alegre, eu estava casada, tinha duas filhas pequenas e meu marido se mostrou contrário à mudança da família. Na avaliação dele, me inscrever para a promoção seria uma “ambição pessoal”, que prejudicaria a família. Disse que se eu optasse pela promoção, ele pediria o divórcio e pediria a guarda das filhas. Assim, deixei de me inscrever junto com minha turma e em razão dessa decisão, perdi aproximadamente 40 posições na lista de antiguidade na carreira, decisão da qual me arrependo muito, hoje em dia.

     

    Ao tomar posse grávida
    Em 1996, grávida, durante a posse no cargo de juíza federal substituta. FOTO: Acervo pessoal.

     

    Os caminhos da vida acabaram me levando ao divórcio, e, finalmente, em 2003, pedi promoção para cidade de Rio Grande, onde fui muito feliz, pessoal e profissionalmente. Ali, inclusive, fui apresentada por uma grande amiga ao João, meu atual marido. Um presente que a vida me deu.

    Não tinha ainda consciência de que esses tropeços na vida profissional tinham, entre suas múltiplas causas, também razões de gênero. Se eu fosse homem, talvez essas questões fossem encaminhadas de forma diferente.

    Na chegada à Vara Criminal de Florianópolis enfrentei dificuldades muito grandes. Uma resistência muito grande à minha liderança e à liderança do Diretor de Secretaria que me acompanhava desde Joinville. Tenho consciência de que foi uma situação muito complexa, com muitas falhas de todos os lados, mas hoje faço o retrospecto e tenho a nítida sensação de que, se eu fosse homem, a situação teria um encaminhamento muito diverso.

    Hoje, nas duas Varas Criminais de Florianópolis atuam 4 juízas. Domínio totalmente feminino.

    O convite feito pelo Desembargador Thompson Flores para exercer a Direção do Foro no biênio 17-19 foi muito, muito importante na minha trajetória. Procuro todos os dias, exercer a função com a máxima dedicação e comprometimento. Pessoalmente, soou como se todas as dúvidas anteriores à minha competência e capacidade fossem sanadas, pois o Tribunal não colocaria uma função tão relevante em mãos de uma pessoa sem qualificação para tanto. Sou muito grata e procuro, a cada momento, fazer o melhor.

     

     

    Recebendo a carteira funcional das mãos do então Presidente do Tribunal Regional Federal da 3a Região Desembargador Sebastião de Oliveira Lima
    Em 1996, recebendo a carteira funcional das mãos do então presidente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região e ex-presidente da Ajufe no período 1988-1993, desembargador Sebastião de Oliveira Lima. FOTO: Acervo pessoal.

     

    5) O que é, a partir da experiência da senhora, ser juíza federal?

    Para responder essa pergunta, preciso antes de tudo, dizer que não concordo com posições “essencialistas”: aquelas que identificam no “ser mulher” características inatas à feminilidade. Assim, não considero que a jurisdição exercida por uma mulher seja “naturalmente” mais humana, mais carinhosa, mais sensível, mais empática e nem melhor que a jurisdição exercida por qualquer outro colega de sexo masculino. Considero que as discussões acerca das dificuldades enfrentadas no acesso à magistratura, na ascensão funcional, no acesso aos Tribunais e aos Tribunais Superiores e nos diversos espaços de poder do Judiciário são demandas por igualdade, em seu aspecto material.

    Ser juíza federal implica, necessariamente, defrontar-se com questões de igualdade que, em algum momento já afetaram ou afetarão sua vida pessoal ou profissional: as dificuldades na preparação e no acesso aos concursos, a acumulação de atribuições profissionais e de cuidado com a família (essas sim, naturalizadas pela sociedade patriarcal como encargos femininos), as dificuldades na ascensão na carreira, a exclusão ou a pouca permeabilidade de mulheres aos espaços de poder etc. Isso sem falar nas mulheres e colegas negras, que além das dificuldades já mencionadas, ainda sofrem discriminação em razão de raça e classe social.

    Ser juíza federal também evoca a lembrança da luta de tantas gerações de mulheres que sofreram grandes perdas, discriminações e violências para que as mulheres de nossa geração possam hoje ocupar esse lugar. Ângela Davis evoca a lembrança das negras escravizadas que, separadas de seus filhos recém-nascidos, eram forçadas ao trabalho duro nas lavouras de algodão do Sul dos Estados Unidos sob açoites. O leite materno, vertido dos seios impedidos de amamentar, se misturando com o sangue dos corpos femininos sob açoites é uma imagem que me toca profundamente. Isso sem falar nas sufragistas, nas pioneiras dos cursos de direito, nas primeiras magistradas, parlamentares, cientistas etc, histórias de muita garra e vontade de vencer.

    Por isso, entendo que ser juíza federal – com consciência histórica dessa condição - é definir-se, necessariamente, a partir das demandas reais de igualdade, que nos colocam em sintonia visceral com todos e todas que possuem os ideais de justiça e de igual acesso aos bens e serviços sociais.

     

    6) Como é administrar uma Seção Judiciária ?

    É uma grande oportunidade de ampliação de horizontes e de aprendizado.

    O campo da gestão pública, nos dias atuais, exige grande profissionalismo, lucidez e visão de futuro, diante das grandes dificuldades do cenário que se apresentam, sobretudo em razão do novo regime fiscal da EC nº 95/2016 que congelou os limites de gastos públicos pelos 20 anos subsequentes à sua promulgação.

    As políticas, estratégias e programas de aperfeiçoamento da prestação jurisdição e da gestão administrativa desdobram-se em várias frentes e o número de servidores diminui gradativamente, em razão das restrições orçamentárias. Tudo isso exige o aperfeiçoamento dos mecanismos, tais como, a gestão dos dados, dos fluxos de trabalho, da gestão de riscos e de pessoas, etc. Enfim, um sistema bem estruturado de governança em rede, com olhos postos na inovação, pois sem soluções tecnológicas e inovadoras, o Judiciário não terá condições de responder aos anseios da sociedade na era digital. Nesse aspecto, a 4ª Região da Justiça Federal tem sido celeiro de soluções que estabeleceram novos paradigmas: o processo eletrônico (E-proc), o processo SEI, o sistema de Assistência Judiciária Gratuita - AJG (esse desenvolvido pelo Núcleo de Tecnologia da Informação de Santa Catarina), o sistema de gestão dos cadastros funcionais (SERH), o sistema de gestão de diárias e passagens etc. Lembrando, sempre, que a tecnologia não substitui o contato humano e a valorização das carreiras da magistratura e dos servidores do Judiciário.

    Por isso, desde o início de minha gestão estabeleci como “lema” a busca constante da empatia. Somente ao vivenciar os dramas e as dores dos usuários dos serviços que prestamos é que poderemos estabelecer um processo de aperfeiçoamento contínuo e duradouro.

     

    7) Na opinião da senhora, é possível conciliar a atividade profissional, acadêmica e familiar?

    No meu caso, tenho a sorte grande de ter um marido que me apóia em todas as minhas iniciativas. Verdadeiro parceiro que torna minhas cargas bem mais leves. Mas é muito difícil levar adiante projetos nessas três frentes sem algum tipo de prejuízo em alguma delas. No meu caso, o prejuízo agora está na vida acadêmica, pois não tenho conseguido me dedicar à minha pesquisa de doutorado (Sobre a compreensão, justificação e definição dos “crimes de ódio” – hate crimes, no Direito Brasileiro) como eu deveria e gostaria.

     

    Posse pulpito
    Em julho de 2017, a juíza federal Cláudia Maria Dadico assumiu a direção do Foro da Justiça Federal catarinense. FOTO: ASCOM Justiça Federal de Santa Catarina (JFSC).

     

    8) O que a senhora sonha enquanto mulher magistrada?

    Sonho com o dia em que as mulheres de todas as raças, classes sociais, orientações sexuais, convicções políticas etc, possam ocupar livremente os espaços de poder, seja no legislativo, no executivo ou no judiciário, na ciência, na cultura, nas artes, no empresariado, nas universidades, de forma isonômica, proporcional à representação masculina e que isso seja um fato cotidiano, natural e corriqueiro, e não uma coisa extraordinária.

    Sonho com o dia em que a Lei Maria da Penha seja desnecessária, que a violência contra a mulher seja uma lembrança remota de tempos distantes. Que o Brasil não seja notabilizado por ocupar lugar de destaque no ranking dos países mais violentos do mundo para as mulheres, tal como ocorre hoje, em que ocupa o vergonhoso quinto lugar.

    Sonho com o dia em que, nós mulheres, não tenhamos mais que ocupar nosso tempo na luta por igual respeito, dignidade e igualdade de oportunidades. Que possamos, tranquilamente, nos dedicar aos nossos campos de interesse, explorar todos os nossos potenciais, sem medo do preconceito, da violência, do assédio e da discriminação.

     

    9) Qual a mensagem a senhora pode deixar para as mulheres que sonham ou já sonharam em seguir a carreira?

    Sabemos que, a despeito de muitos avanços, ainda há obstáculos consideráveis ao ingresso das mulheres na magistratura. Dupla ou tripla jornada de trabalho, uma concepção estrutural que desestimula as estudantes a almejarem a magistratura, ausência de políticas públicas eficazes de controle de natalidade para as mais jovens etc.

    Além disso, o nível de complexidade das provas exige um grande tempo de preparação com exclusividade, o que retira, ou dificulta muito, o ingresso de candidatos que trabalham.

    O resultado é que, apesar de representar a maioria, dentre os formandos dos cursos de direito, apenas 37% dos cargos da magistratura nacional são ocupados por mulheres, segundo os dados do último censo do CNJ.

    Apesar de tudo isso, minha mensagem é de força e perseverança, sempre!

    A magistratura é uma carreira maravilhosa, de muito prestígio e muito valorizada. O Brasil precisa de mais diversidade em sua composição.

     

    lançamento livro
    Em março de 2018, durante o "II Seminário Mulheres no Sistema de Justiça: Trajetórias e Desafios", promovido pela Ajufe em parceria com a Amagis-DF, em Brasília, a juíza federal Cláudia Dadico acompanhou, junto a outras magistradas, o lançamento da obra "Equidade e Magistratura - Estudos sobre gênero e raça no Poder Judiciário", organizada pelos juízes federais Clara da Mota Pimenta e Roberto Carvalho Veloso, ex-presidente da Ajufe, e pela juíza de direito Rejane Jungbluth Suxberger. FOTO: ASCOM Ajufe/André Coelho.

     

    10) Deixe alguma mensagem ou fale sobre algo que acredite que não tenha sido contemplado nas perguntas anteriores.

    Gostaria de agradecer pela oportunidade de contar um pouco da minha história e, assim, prestar uma singela contribuição para a discussão sobre as questões de gênero e magistratura. Espero que a Ajufe sempre incentive e encoraje tais discussões. Trata-se de algo muito além de uma simples demanda ou tentativa de privilegiar um segmento da magistratura. Trata-se de uma questão de representatividade social plena, fundamentada nos ideais de justiça, pluralismo e diversidade, princípios fundamentais do Estado Constitucional de Direito.

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