Dados da Justiça Federal confirmam pesquisa da Comissão Ajufe Mulheres de 2017
Um estudo divulgado essa semana pelo Conselho Nacional de Justiça aponta que a participação feminina em bancas de concursos para juiz é de apenas 20,6% dos examinadores. O levantamento foi divulgado durante o Seminário "A Participação Feminina nos Concursos para a Magistratura", promovido pelo CNJ. Segundo a pesquisa, o percentual está relacionado à quantidade de magistradas nos grupos de juízes e desembargadores responsáveis por avaliar e aplicar as provas orais - última etapa eliminatória do certame -, além de julgar recursos apresentados pelos candidatos.
O número é ainda mais baixo na Justiça Federal: as 33 integrantes dessas bancas nos últimos dez anos correspondem a apenas 13,1% do total de examinadores. O dado corrobora as conclusões de uma pesquisa divulgada em 2017 pela Comissão Ajufe Mulheres. O percentual de mulheres em bancas de concurso na justiça federal aumentou pouco mais de 5% desde a primeira banca examinadora após 1988, quando o percentual foi de 7,9%.
"Quando fazemos análise de mulheres como membros titulares nas bancas, na comparação com suplentes, esse percentual cai de 13% para 8%. Isso se conecta aos dados de outra pesquisa divulgada pelo CNJ em 2019: a sobrerrepresentação feminina nos níveis mais baixos da carreira: 45% das juízas no país são substitutas", afirma a juíza federal Tani Wurster, coordenadora da Comissão Ajufe Mulheres.
Na Justiça Federal, o percentual de magistradas na carreira caiu em relação à época dos primeiros concursos organizados pelos tribunais regionais federais imediatamente após a promulgação da Constituição Federal de 1988 — de 34,6% para 31,2%. Segundo pesquisa anterior do DPJ/CNJ, 38% de toda a magistratura brasileira é composta por mulheres.
A informação que causou maior impacto, no entanto, foi a ausência de dados sobre a raça/cor dos membros em grande parte das comissões e bancas, e a baixa representatividade de mulheres negras nesses espaços. Os membros pretos e pardos somaram apenas 1% e 4,5% do total de examinadores com raça/cor informada. Entre os primeiros há apenas duas mulheres, enquanto que entre os segundos, elas correspondem a menos de 1/3 desse já baixo percentual.
De acordo com a Juíza Karen Pinheiro, "o critério racial, interseccionado ao de gênero, faz muito mais seletivo o sistema de justiça, mantendo mulheres negras nos mesmos empregos que lhe foram dados quando sequestradas de África para construir a riqueza deste país," o que produz "mais do que deficit democrático, um deficit civilizatório com a população negra."
Pluralidade e qualidade da seleção - A pesquisa não confirmou a hipótese segundo a qual mais mulheres seriam aprovadas naqueles concursos com maior participação feminina nas bancas. "Não foi possível encontrar tendência que relacionasse a maior participação feminina em bancas e maior aprovação de mulheres. Em alguns casos houve mais aprovações e, em cenários contrários, também. Essa relação demanda uma investigação mais qualitativa no futuro", afirmou a pesquisadora do DPJ e doutora em ciências sociais Elisa Sardão.
De acordo com a desembargadora federal Therezinha Cazerta, mais mulheres na composição das bancas examinadoras vai beneficiar o Poder Judiciário ao acrescentar aos processos seletivos traços mais associados ao feminino, como a empatia e a percepção mais precisa da comunicação não-verbal. A magistrada citou a pesquisa de doutorado da neurocientista Camila Campanhã, que estudou as relações entre gênero, empatia e tomadas de decisão, à luz da teoria dos jogos.
De acordo com a juíza Tani Wurster, a diversidade dos olhares das mulheres vai agregar novas perspectivas que farão diferença no resultado final da decisões. “As mulheres experienciam o mundo de lugares diferentes. As perspectivas são diferentes, por exemplo, entre mulheres brancas e negras porque as negras são atravessadas pelo racismo. Permitir que decisões judiciais em bancas de concursos sejam proferidas majoritariamente por membros de um mesmo segmento social – homens brancos, de meia-idade, heterossexuais – interdita a influência da experiência dos demais atores sociais – mulheres, mulheres negras, homossexuais, pessoas com deficiência – no resultado final das decisões tomadas nesses espaços de poder", avaliou.
Metodologia - Em abril deste ano, o CNJ consultou por meio de ofícios os 27 tribunais de Justiça, os cinco TRFs, os 24 Tribunais regionais do Trabalho (TRTs), e os três tribunais da Justiça Militar Estadual. Além das respostas de 54 tribunais — a pandemia impediu alguns de participar — a equipe do DPJ levantou 48 editais de 77 concursos realizados desde 2010. Analisou ao todo 328 documentos, entre editais e provas, com técnicas de mineração de textos e depuração dos textos contidos em arquivos de imagem (PDF) para torná-los passíveis de leitura.
Acesse a pesquisa do CNJ: https://bit.ly/3l5pLO3
Com informações da assessoria de imprensa do Conselho Nacional de Justiça