Com base no Protocolo de Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça, a Justiça Federal garantiu a uma dona de casa o direito ao recebimento de benefício por incapacidade temporária para o trabalho.
A decisão é da 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais de Santa Catarina que considerou, na última sexta-feira (28/7), que a atividade de cuidar da própria casa não é diferente das atribuições exercidas pelos demais trabalhadores domésticos protegidos pela Previdência.
O benefício deve ser pago desde agosto de 2021 e permanecer ativo por mais 60 dias a partir da data do julgamento, com possibilidade de pedido de prorrogação à Previdência.
A primeira instância havia negado o pedido, por considerar que a autora estava apta para exercer trabalhos domésticos, que podem ser desenvolvidos "sem cobrança de horário e produtividade". A sentença levou em conta o laudo pericial.
Na Turma Recursal, o relator, juiz federal relator Jairo Gilberto Schäfer, apontou que o exercício das funções de dona de casa "não se limita a atribuições leves de menor comprometimento físico".
Para ele, embora a trabalhadora nessas circunstâncias tenha "maior flexibilidade e liberdade para gerenciar o tempo e organizar suas tarefas", a atividade "exige plena capacidade de trabalho, à igualdade daquela presente no exercício das demais funções similares protegidas pela Seguridade Social".
Na visão do magistrado, não se pode desqualificar o trabalho da dona de casa com base "em estereótipos de gênero, que vulneram os direitos fundamentais como um todo".
Schäfer ainda lembrou que é possível "afastar a conclusão do laudo pericial sempre que o conjunto probatório indicar solução constitucionalmente adequada em sentido contrário".
No caso concreto, ele reconheceu que parte das atividades exercidas pela autora "demandam esforços moderados", especialmente do tronco e dos membros superiores — onde a mulher apresentou problemas. Desta forma, ele concluiu pela incapacidade temporária, com possibilidade de recuperação.
O Protocolo do CNJ, obrigatório desde o último mês de março, exige que os tribunais considerem as condições específicas das pessoas envolvidas, a fim de evitar preconceitos e discriminação por gênero e outras características.
Ajufe Mulheres - Jairo Schäfer ainda citou, no voto, a obra Julgamento com Perspectiva de Gênero, das juízas federais Tani Maria Wurster e Clara da Mota Santos Pimenta Alves: “não reconhecer a incapacidade de uma mulher, ou reconhecê-la apenas de maneira parcial, em razão de ela poder ainda desempenhar atividades relacionadas à reprodução social, como afazeres domésticos, caracteriza uma mensagem atentatória aos preceitos de igualdade – tanto em sua dimensão de inclusão quanto de equidade”.